Os bêbados de Iêda não têm vez nem voz,
eles têm apenas uma embriaguez encharcada de tantas dores
que só a bebida mesma teve a coragem de encarar face a
face.
Iêda, tanto da cor dos quilombos, negra de raça e com
muita graça,
sabe ouvir os seus entes já descrentes da realidade.
Ela advoga a causa dos seus excluídos,
banidos da consciência de si e dos outros,
exilados nos destilados.
Em meio à fala mole, bêbada, há uma vida dura, diversa,
que se deseja tornar meramente líquida, sorvida em partes,
em goles.
No rádio uma voz negra exala o cuidado
ou tenta evaporar a discriminação variada em
preconceitos...
Ao som do tambor duma crioula espiritual
bailam sentimentos genéticos duma só raça humana.
Iêda Maria bebe a vida e com ela se embriaga,
encontra objetivos para mil anos futuros,
muito além das leis, lúcida, ela bem sabe que a luta está
sempre recomeçando...
e feliz com o seu recomeço, corajosa, estudiosa, valente,
teimosa,
como o seu jeito de sair e de seguir vitoriosa.
Nenhuma Polyanna se comparará a ela, preta concreta.
É que as Polyannas têm outros sonhos envoltos em brumas...
Ai... e os meus índios dizimados em seus direitos,
também embriagados, ou pior, suicidados!
Qual Iêda responderá aos seus pedidos de pão velho?
À fome de justiça que eles também têm?...
Quando soar o tambor, o poeta ouvirá apenas
o som duma natureza primeva,
quando a Terra e os seus tupinambás e tupiniquins
andavam nus e de mãos dadas,
e enfim amanheciam felizes e esplendorosos com o Sol...
Ismael Machado
(Do livro Folhas ao Vento, 2015, Life)
O poeta não deixa que se esqueça da dor, da opressão. Que a luta seja diária.
ResponderExcluirJamais poderia esquecer, meu bom amigo. Assim seja. Abraço, Ismael.
ExcluirTocante! Forte! Não há alma sensível
ResponderExcluirque deixa de sorver as menções recheadas de poesias contidas na magnificência desse texto. Salve todas as Iêdas Marias desse nosso Brasil! Salve Poeta Esmael!
Beijos de Luz!
Quanta sensibilidade em suas palavras, tocantes. Obrigado, de coração, Ismael.
Excluir