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domingo, 30 de janeiro de 2022
Leituras e viagens
sábado, 29 de janeiro de 2022
domingo, 23 de janeiro de 2022
sexta-feira, 21 de janeiro de 2022
Belíssima mensagem do filho do poeta Thiago de Mello, texto muito poético, pleno de vida!
Passei
três semanas no Amazonas, viajando sozinho. Se é que é possível dizer que
viajei sozinho, pois sempre estive acompanhado de gente que me quer bem, amigos
e familiares que encontrei pelo caminho. Gente que amo e que me constitui. Fui
com dois propósitos nessa imersão solitária. O primeiro, visitar meu pai. Estar
com ele por alguns momentos, já ciente da situação de saúde, e cuidados, na
qual ele se encontrava.
Depois, fui com o objetivo de iniciar uma reforma inadiável em nossa casa à beira do rio, em Freguesia do Andirá, no interior do município de Barreirinha, a quase 350 km de Manaus. Um dia de barco pra chegar até lá. A casa me pede zelo já há um tempo e estou há uns meses organizando uma campanha para arrecadar recursos para as obras. Consegui uma parte do dinheiro através da generosidade e da compreensão de muitos amigos e conhecidos, todos amantes da amizade, da poesia, da Amazônia e da obra literária de meu pai. Todos sonhadores como eu, que sabem, como meu pai, que arte e cultura geram evolução individual e progresso social.
Embarquei no final de dezembro para Manaus, sendo acolhido pela minha família amazonense que tanto quero bem. Fui ao apartamento de meu pai e Pollyanna. Ele já estava praticamente sem se levantar. Fui até o quarto. Quando ouviu minha voz, comentou: "voz bonita a do meu filho". Com a memória dissolvida pelo tempo (do qual não se corre) e pelas neuropatias, perguntou meu nome e se eu tinha filhos. Disse que me chamava Thiago e que tinha duas filhas. Nossas mãos entrelaçadas num carinho suave e ancestral. "Mas então nós temos o mesmo nome", ele notou. Falei que isso tinha sido invenção dele, pôr meu nome Thiago Thiago de Mello. No que ele, após um certo silêncio, falou baixinho: foi pra ficarmos juntos até mesmo no nome. "Cuida bem das suas filhas!" (Eu me emocionei muito nessa hora porque queria dizer a ele que se sou um bom pai é porque ele foi o melhor formador e educador que eu pude ter). Seguimos nossa conversa cheia de silêncios e respirações. Ele quis saber o que eu fazia da vida. "Canções e poemas", não titubeei. Fez que sim com a cabeça e repetiu "canções e poemas, isso". Perguntei se eu estava indo no caminho certo. "Certíssimo", ele me disse com a voz grave de trovão adormecido. Comentei que estava indo para Barreirinha cuidar da nossa casa, pedi a sua benção ("Deus lhe abençoe", me beijando a mão) e segui o meu caminho rumo ao rio Andirá, dos Saterês-maués. Fiquei semanas num país submerso, me nutrindo do passado, de banho de cheiro, tucumãs, ovas de curimatã, sombra de castanheira, amizades verdadeiras e caldeiradas de tucunaré e tambaqui.
Voltei pra Manaus e fui ao apartamento ver meu pai. Ele não me respondeu, já completamente dentro do seu próprio mundo, distante daqui. Pedi um violão e, então, comecei a tocar. As lágrimas caíram, eu sentado e ele deitado na cama. Tirei do baú as canções que sempre cantávamos juntos: "Azulão", "Por que tu te escondes", "Linda vida", "Pai velho", "Quem me levará sou eu", "Faz escuro, mas eu canto". Fiquei ali cantando por mais de trinta minutos, a primeira vez em nossas vidas que ele não cantou junto comigo. Foi um concerto de despedida. A nossa despedida tinha que ser com música e poesia, universo no qual sempre nos encontrávamos. Saí dali e fui comer um pacu assado na brasa, em sua homenagem. Botei bastante pimenta murupi e tomei um suco de taperebá pra aliviar o peito. No dia seguinte, logo cedo pela manhã, papai atravessou o rio da vida. Morreu dormindo, bravo merecedor. Parece que estava só me esperando para seguir à Casa do Infinito. Sincronicidade astral, projeto dos deuses, dádiva da natureza. Ele foi em paz. Estamos de luto, mas em breve cantaremos com alegria, como ele sempre nos ensinou."
Thiago Thiago de Mello
quarta-feira, 19 de janeiro de 2022
domingo, 16 de janeiro de 2022
sábado, 15 de janeiro de 2022
sexta-feira, 14 de janeiro de 2022
Thiago de Mello, o poeta adormeceu aos 95 anos
(Ato Institucional Permanente)
Fica decretado que agora vale a verdade,
que agora vale a vida,
e que de mãos dadas,
trabalharemos todos pela vida verdadeira.
Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.
Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.
Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
duvidar do homem.
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.
O homem confiará no homem
como um menino confia em outro menino.
Fica decretado que os homens
estão livres do jugo da mentira.
Nunca mais será preciso usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de palavras.
O homem se sentará à mesa
com seu olhar limpo
porque a verdade passará a ser servida
antes da sobremesa.
Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.
Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridade,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.
Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a quem se ama
e saber que é a água
que dá à planta o milagre da flor.
Fica permitido que o pão de cada dia
tenha no homem o sinal de seu suor.
Mas que sobretudo tenha sempre
o quente sabor da ternura.
Fica permitido a qualquer pessoa,
a qualquer hora da vida,
o uso do traje branco.
Fica decretado, por definição,
que o homem é um animal que ama
e que por isso é belo.
muito mais belo que a estrela da manhã.
Decreta-se que nada será obrigado nem proibido,
tudo (de bom) será permitido,
inclusive brincar com os rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia na lapela.
Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.
Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.
Expulso do grande baú do medo,
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar
e a festa do dia que chegou.
Fica proibido o uso da palavra liberdade,
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre
o coração do homem.
quarta-feira, 12 de janeiro de 2022
segunda-feira, 10 de janeiro de 2022
domingo, 9 de janeiro de 2022
No caminho do silêncio
To George Fox and Margaret Fell
Encontrei a solidariedade e a paz enamoradas,
aos mais doces abraços e beijos.
sobre amores e amizades inefáveis, inenarráveis.
Os sons do silêncio ali arrefeceram
sábado, 8 de janeiro de 2022
Árvore da Vida, Árvore Celestial
Ou dos corais dos mares imensos,
Tu eras Cora Coralina.
Ainda plantada na terra
Já habitavas o teu sobrado celestial,
Branco-alvo, com o brilho das estrelas
Onde habitas agora.
Mas, aos transeuntes, de que vale tudo isto?
Ismael Machado