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quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

domingo, 11 de dezembro de 2022

Carta a minha mãe, de Miryan Lucy Rezende

Carta a minha mãe, texto de Miryan Lucy Rezende

Mamãe, se me perguntarem como continuei minha vida depois da sua definitiva viagem, acho que, provavelmente, vou falar de aceitação, de fé, de força diante do impossível, do imponderável e do definitivo. 

Devo dizer ao meu interlocutor que a vida segue e que, com o tempo, a dor vai se transformando, pelas recordações, em saudade. Tudo o que se diz sobre perdas provavelmente caberá nessa resposta.

Mas, hoje, exatamente hoje, 15 anos passados de sua última respiração aqui nessa estação chamada Terra, fui eu mesma me fazer essa pergunta. Como, minha mãe, continuei a vida depois de sua ida para a Casa Maior? 

Órfã. Foi com essa roupa que nunca antes tinha usado, essa indumentária apertada, desconfortável, fria, descabida e sem cabimento, que calcei meus dias, meu corpo e meus pés para percorrer uma estrada igualmente fria e assustadoramente árida.

No começo fiquei à margem, olhando aquele infindável nada à frente. É assim mesmo o primeiro impacto da dor. Ela nos interrompe, nos  engessa, nos paralisa. Somos nós, mas não somos nós mesmos. Somos seres impregnados da despedida que não buscamos e não queremos, enfartados de susto, esgarçados pela ruptura, encharcados de choro e adeus. 

Nesse ponto, mãe, a gente desacredita, tenta burlar a realidade, mas ela vem tão cruel quanto  a própria morte nos dizer que não há amanhã, e que nele não cabem mais telefonemas, risadas, almoços aos domingos, feriados para voltar pra casa, férias para planejar, não há mais a mão que nunca faltou em resposta ao pedido de bênção. E quem para dizer de novo, com o aval do próprio Criador: Deus te abençoe, minha filha!? E como ir a algum lugar, a qualquer lugar sem o "vai com Deus" de cada dia?  É quando estar perdido no mundo é estar, de fato, sem mãe. 

Por isso, não foram fáceis os primeiros passos sem você.

Mas, depois, querida mamãe, com o passar do tempo e o aumento da dor, com a realidade já bem grudada à nossa roupa de orfandade, a gente precisa mesmo levantar e encarar a estrada, como que para honrar seus ensinamentos, que dentre tantos incluía fé e coragem. Sem cor, sem estações, a gente vai ensaiando um jeito novo de se acertar com a vida, afinal precisamos dar conta dela. O tempo passa, e esse tempo a gente só atravessa porque se segura no amor que a gente teve.

Então, 15 anos passados daquele novembro, 22, quinta-feira, devo dizer que não há um dia sequer que esse amor não esteja presente em mim. Ele vem em forma de cheiro, com sabor de sons, entra pela casa, dorme no meu quarto, sobe comigo as escadas, me sorri nas esquinas. 

Você é mais que lembrança, é mais que saudade, é uma presença que acende minhas certezas, destrói meu desamparo, não larga do meu pé. Às vezes, misturo as coisas e me pego pensando em ligar para uma prosa; outras, penso na risada que você soltaria gostosa e larga, quando eu lhe contasse certas coisas, e acabo ouvindo esse riso no sorriso que se forma em mim. 

Sempre sei que você está por perto, porque aquele cordão mágico, que eles chamam de umbilical e cortam pra separar a gente no nascimento, vai sendo reconstruído, recosturado com o fino fio dos mistérios, que liga o humano ao divino. Refeito, ele nos devolve a nós mesmos, e a gente volta a respirar, comer, andar, viver. 

Foi assim com a gente, minha mãe. Você sabe. E, hoje, em uma outra esfera, de outras formas, em novas dimensões, vamos de mãos dadas. De almas dadas.

Porque eu e você fomos feitas para o sempre.

Foi o Poeta Maior que disse, quando bem no começo de tudo, inventou mãe, filhos e a canção de ninar.

A sua bênção, mãe!

sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Tempos de dezembro, de Victor Barone

Imagem by Vini Willyan

Tempos de dezembro
Me trazem um gosto de sal
Um travo de fim na língua revolta
Me ardem os lábios cheios de ontens
De pedras estradeiras que pra longe chutei

Tempos de dezembro
Me levam pra dias que foram
Mares encrespados que naveguei
Me entortam as cores e os dentes
E rangem nas letras que bem aqui se apagam

Victor Barone

segunda-feira, 28 de novembro de 2022

... é facil escrever um poema...


é fácil escrever um poema
difícil é 
– pelas décadas que se agregam
pelos vícios que me pegam
pelos sonhos que se quebram
– não deixar morrer
o olhar de encantamento

é fácil escrever um poema
difícil é fazer do corpo templo
capturar na veia e no verso
os ritmos do silêncio

é fácil escrever um poema
talvez leve alguns minutos apenas
talvez surja num sonho
numa alvorada do peito
numa madrugada embriagada

difícil é deixar a fenda aberta
despir as máscaras
desconstruir os passos
reinventar a existência
cotidianamente

é fácil sentar e escrever um poema
difícil é resistir
e fazer da vida
poesia

Clara Baccarin

Andar com fé, salve Gilberto Gil


Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá

Que a fé 'tá na mulher
A fé 'tá na cobra coral
Oh, oh
Num pedaço de pão
A fé 'tá na maré
Na lâmina de um punhal
Oh, oh
Na luz, na escuridão
Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá (olêlê)

Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá
Olálá
Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá
Oh, menina
Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá

A fé 'tá na manhã
A fé 'tá no anoitecer
Oh, oh
No calor do verão
A fé 'tá viva e sã
A fé também 'tá pra morrer
Oh, oh
Triste na solidão
Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá
Oh, menina
Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá

Certo ou errado até
A fé vai onde quer que eu vá
Oh, oh
A pé ou de avião

Mesmo a quem não tem fé
A fé costuma acompanhar
Oh, oh
Pelo sim, pelo não
Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá
Olêlê

Andá com fé eu vou
Que a fé não costuma faiá
Andá com fé eu vou

Compositor: Gilberto Passos Gil Moreira

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Além do horizonte, de Erasmo e Roberto

*05.06.1941 / +22.11.2022

Além do horizonte deve ter
Algum lugar bonito pra viver em paz
Onde eu possa encontrar a natureza
Alegria e felicidade com certezal

Lá nesse lugar o amanhecer é lindo
Com flores festejando mais um dia que vem vindo
Onde a gente pode se deitar no campo
Se amar na relva escutando o canto dos pássaros
Aproveitar a tarde sem pensar na vida
Andar despreocupado sem saber a hora de voltar
Bronzear o corpo todo sem censura
Gozar a liberdade de uma vida sem frescura...
Além do horizonte existe um lugar
Bonito e tranquilo
Pra gente se amar...
Compositores: Erasmo Carlos e Roberto Carlos

domingo, 20 de novembro de 2022

Aberta em São Paulo a primeira clínica para dependentes de gerúndio

A crescente onda do gerundismo levou o Ministério da Saúde a inaugurar a primeira clínica para o tratamento desse mal, em São Paulo. O Centro de Atendimento ao Gerundismo Universal Endêmico Intenso (CAGUEI) vai atender a pessoas cujas vidas se transformaram num inferno devido ao gerundismo.


A atendente Sheila Cristina, de 35 anos, acredita que finalmente conseguirá largar o vício com esse novo tratamento. "-Vou estar me internando, pra poder estar me curando desse problema e tenho certeza de que vou estar tendo resultados muito em breve. Agradeço a atenção.", disse ela.


Ontem, durante o lançamento da clínica, o secretário de saúde Antonio Nascimento comemorou a iniciativa. "-Vamos estar curando muita gente que está precisando de tratamento e nem sequer está  sabendo."


Fonte: @linguaportuguesa_

domingo, 13 de novembro de 2022

quarta-feira, 9 de novembro de 2022

Vaca Estrela e Boi Fubá, Rolando Boldrin

Para ver o vídeo pelo celular, clique em 
versão para web ao final da página. 

Rolando Boldrin
*22.10.1936
+09.11.1922

terça-feira, 1 de novembro de 2022

Ensaio sobre um desejo escondido

Me fiz mulher de plumagem aveludada, cuspindo fogo de manhã todo dia em que esteve o sol.


Esqueci as argolas dos pés em algum canto, algum amasso, em algum escuro de madrugada.


Sei aonde estou com vontade de ir e vou, sempre que podem os olhos comemo-nos nus nas nossas incertezas.


Minto, às vezes, para não magoar as veias que saltam em denúncia, não queria mentir, mas vou que o laço está torcido de verdades dúbias.


Esquece teu colo em algum canto que eu lá vou, voo, ensaio um sim.


Todas as ilhas se aproximam de mim, não sou importante - elas insistem - eu declamo um poema antigo, gasto, por isso mesmo faz sentido.


Sou uma ilha cheia de mastros hirtos a me levantarem ventos afora, gozo adentro.


Tânia Gauto

domingo, 30 de outubro de 2022

Símbolo da Paz

Que o Verde-Brasil das nossas matas, com modos republicanos, ele (o verde) e elas (as matas), por augusto dever, sejam preservados para as gerações e gerações de brasileiras e brasileiros.


Que o amarelo-ouro das ricas terras indígenas não caia nas meras mãos de garimpeiros mercurizados.

1a. Bandeira do Brasil Império,
ainda com a coroa Real, durou poucos meses.

Que o azul-anil dos nossos mares, dos céus do Brasil, seja cuidadosamente exaltado, elevado aos céus dos nossos mais caros sonhos.

2a. Bandeira do Brasil Império,
já com a coroa Imperial e 19 estrelas, 
de 1822 a 1835.

As cores verde e  amarelo, cujas raizes vêm dos brasões dos Braganças e dos Habsburgos, reais famílias plantadas em solo pátrio. Cores essas transplantadas para a República e seus intentos.

3a. Bandeira, do Brasil Império, 
com 20 estrelas, de 1835 a 1889.

Vultoso o afeto em nosso peito varonil, do alto desse imenso pavilhão  contemplamos o futuro com justiça, com amor pelo povo demasiado sofrido. 


E esse céu no qual o branco-rei se dobra ao azul-majestoso, cuja paz transcende as dores ou festas, que excede toda serenidade.

Bandeira da República do Brasil,
de 1889 até hoje. 

Sagrado símbolo, pendão da esperança, esplendor das estrelas, que o seu significado jamais, por partidarismos, seja ultrajado.


Nessa amada terra há de progredir o positivismo comteano, o qual não agride a ordem natural dos rios que lavam o bem, que seguem com absoluto respeito à natureza das coisas mais simples.

Ismael Machado

Bandeira Brasileira Estilizada 

sexta-feira, 28 de outubro de 2022

What’s on Earth

Há suicídios em ocas vazias de sentido.
Há desolações pungentes
em corações outrora ardentes.
Há mãos famintas pedindo migalhas.

Há guerras e rumores, dominações
e políticos sem pudores.

Há crimes, prisões, desmatamentos,
decepções, dores, sofrimentos e frustrações.
 
Entretanto, muito além desse tormento,
também tem alguma esperança
brilhando nos olhos inocentes daquela criança.
 
Ismael Machado

terça-feira, 25 de outubro de 2022

Supostas prisões

Há prisões neste mundo, em doenças,
que prendem os moribundos
aos seus leitos de dores, dos quais
somente a morte vem libertar depois.

Há prisões que badalam os seus sinos,
chamando os inocentes ou pobres pecadores
às suas celas de doutrinas,
para as quais os incautos prisioneiros
caminham ainda cheios de esperanças.

Há prisões em si mesmo, as quais prendem mais
do que as grades de metais das cadeias,
donde é difícil se soltar. Necessitam psicólogos,
psiquiatras, quais carcereiros, para ajudar
na soltura de traumas e tramas
das celas escuras do inconsciente.

Há prisões em transtornos e em suas literais pretas tarjas.
 
Ismael Machado

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

De pirata, esse coração

Coeur de pirate não tem pena de mim, 
de ninguém, em altos mares, 
traições e tormentas,
e esse medo do mar, esse medo de amar,
que me afugenta e fujo e navego
e singro introverso ou contra o verso.

Poemas são cartas controversas
endereçadas ao meu coração,
serão lidas sim, por toda uma vida.
 
Quero ser e estar livre em cada estrofe.
Libertas quae será tamen eis o meu lema, 
de modo inconfidente,
agora confesso,
pois em cada linha eu o professo.

Ismael Machado

domingo, 23 de outubro de 2022

Rosas mudas

As rosas já nem choram mais, cansadas, estão caladas, 

emudecidas, não dizem nada, nenhuma queixa sequer.
Sem o seu perfume, as rosas meramente brilham
aos olhos lacrimejados, sem a sua beleza, o sorriso
ficou perdido na mente, sem qualquer (en)canto.
 
Por certo, essas mesmas rosas, emudecidas ao meu lado, 
serão depositadas em lágrimas sobre o meu caixão!
N’outras paragens, quiçá numa vida desconhecida,
com outras rosas, reflorescidas, minh'alma cantará.
Outra vez, ali, talvez, baterá meu coração e daqueles olhos,
de chorar, tristonhos, com esperanças, ressurgirá outro sol
que os olhos tresloucados, desmesurados, decerto, verão.
 
Ainda me pergunto, sobre isso, nesse lugar insabido,
o que será que as rosas dirão?
 
Ismael Machado

sábado, 22 de outubro de 2022

Sonhos nos desvãos

 

Pipas são esqueletos voando,
libertos, nas amplitudes celestes.
Elas vertem lágrimas 
pelas linhas,
caem feito chuva, 
arrefecem a aridez.
 
Pipas não entendem 
de políticas,
mas visitam os poemas envaretados
e fazem deles os seus partidos.
 
Minha pipa eu a empunho 
com palavras,
eu a vejo subir sonhando, delirando
e nenhum cerol ditatorial 
a poderá cortar.
 
Mágicos braços empunham minha pipa,
com ela possuo o céu em minhas mãos, 
possuo a terra, sem esses humanos desvãos.
 
Ismael Machado

sexta-feira, 21 de outubro de 2022

Na Casa da Poesia


Violetas tristes olham-me com os seus versos póstumos,
roxos duma saudade, ali, elas, depostas sobre o meu corpo,
morto, num ataúde, gélido, para sempre adormecido
e depois sepultado num jardim fechado, em névoas,
onde florescerá em novas flores, em novas estrofes,
plenas de natureza, de um’outra beleza no rumo
do fim do exílio ao longo deste mundo, lá onde
as borboletas eternas irão poisar circunspectas.
 
Bem sei que irei além dessa névoa ou nada,
serei colocado na terra, ao lado duma sequoia milenar,
serei plantado no solo fértil do coração dos leitores
ávidos de toda beleza. Sinto quanto é curto o amor,
tanto longo, dele, o olvido, daquela pungente dor.
 
Ismael Machado