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quinta-feira, 16 de julho de 2015

Comentários de Sonia Mara Ruiz Brown, Dra. em Literatura Portuguesa pela USP - Parte II

(Sobre o livro Folhas ao vento, Life Editora, 2015).


... O estudioso holandês Huizinga nos diz “O que a linguagem poética faz é essencialmente jogar com as palavras. Ordena-as de maneira harmoniosa e injeta mistério em cada uma delas, de modo que cada imagem passa a encerrar a solução de um enigma”. É exatamente o que podemos encontrar em Folhas ao vento: o jogo das palavras, a harmonia desse tabuleiro e o mistério nele contido para, então, alcançar o enigma nele inserido. Exemplo desse processo está no poema “Nos campos do outono” (texto 181) em que o eu lírico, através da grande metáfora do outono, expõe suas pequenas falhas que se desvanecem pela força do momento através de “fruto nem sempre amargo, às vezes agridoce,/ levado pelas correntezas dos ventos nos bicos dos sabiás” e, sob essa mesma força, poderá “saciar a fome do povoado de esperanças”, ou ainda “sementes frutificaram no ventre da mulher/ o rebento de vida colossal”. Todas as figuras apresentadas confluem para a construção de um novo tempo beneficiado pela chegada do outono.

È, no trabalho com a palavra, que o poeta encontra um modo de suportar um mundo muitas vezes impregnado de hostilidade, mas também de festejar com exuberância e gozo evidentes as benesses do viver.

Já disse o grande crítico literário português Eduardo Lourenço que não há nada a dizer de um poema, “porque tudo o que dissermos dele se nos afigurará inferior a ele”. O texto representa um trabalho sobre o melhor modo de dizer o que diz, por isso é o bastante citá-lo como farei ao desejar que possa haver, no momento de as flores novamente aparecerem, um outro canto com sabiás “sob outras alcunhas, nos laranjais eternos” , outros “versos do alvorecer” que pareçam “gaivotas plainando,/ singrando os ares em frases e versos”.

Sonia Mara Ruiz Brown
Dra. em Literatura Portuguesa pela USP

2 comentários:

  1. Dizia meu professor Tomas Back BB: "escrever é 99% transpiração e 1% inspiração"

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  2. Caro João, esta frase se bem me lembro é do Afonso Romano Santana, um excelente escritor brasileiro. Grato pelo seu comentário e bem-vindo ao Blogue. Um abraço meu amigo. Ismael.

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